terça-feira, 19 de julho de 2011

Iannos Ritsos





CONHECIMENTO





Um sol de pedra viajou ao nosso lado

queimando o ar e os espinhos do deserto.

À tarde deteve-se na margem do mar

como uma lâmpada amarela num grande bosque de recordações.



Não tínhamos tempo para tais coisas – no entanto

dávamos de vez em quando uma vista de olhos – e sobre as nossas mantas

conjuntamente com as manchas gordurosas, a cor, e caroços de azeitona,

repousavam algumas folhas de salgueiro, e agulhas de pinheiro.



Tinham também estas coisas – não muito importantes – o seu peso:

a sombra de uma forquilha no muro, até ao ocaso,

a marcha do cavalo à meia-noite,

uma cor rosa que morre na água

deixando atrás de si o silêncio mais solitário ainda,

as folhas da lua caídas entre a erva, e os patos selvagens.



Não temos tempo – não temos,

enquanto as portas se convertem em mãos cruzadas,

quando os caminhos são como aquele que diz “não sei nada”.



No entanto, sabíamos que para além da grande encruzilhada

há uma cidade com milhares de luzes coloridas.

Lá as pessoas saúdam-se com um único movimento da sua face –

reconhecemo-las pela posição das suas mãos,

pelo modo como cortam o pão,

pela sua sombra sobre a mesa à ceia,

pelo momento em que todas as vozes adormecem nos seus olhos

e uma só estrela cruza a sua almofada.



Reconhecemo-las pelo sulco de luta nas suas sobrancelhas

e, sobretudo – nas noites em que o céu se amplia sobre eles –,

reconhecemo-los por aquele tranquilo e oculto movimento

com que atiram o seu coração como um jornal clandestino

por debaixo de uma porta fechada ao mundo.



Versões minhas - © Amadeu Baptista



Iannos Ritsos nasceu na Grécia a 1 de Maio de 1909. Aderiu ao Partido Comunista Grego, em 1931. Publicou Tractor, em 1934, inspirado no futurismo de Maiakovski. Devido às suas ideias políticas, algumas das suas obras foram queimadas em público. Foi internado em vários campos de reabilitação. No entanto, a sua produção poética é imparável, com dezenas de títulos. Em 1956, é-lhe atribuído o prémio nacional de poesia pelo livro Sonata ao Luar. Conjuntamente com Giorgios Seferis e Odysseus Elytis, é considerado um dos mais importantes poetas gregos do século XX. Faleceu a 11 de Novembro de 1990.


Haris Alexiou, Oi filoi mou xaramata:

1 comentário:

  1. Obrigado por me apresentar esse poeta, li em voz alto seus veros e deveras encantador a musicalidade e sequência de imagens

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