domingo, 10 de julho de 2011

A adolescência / 5

MIL NOVECENTOS E SETENTA



A dois de Dezembro de 1970

comecei a trabalhar como paquete.



Naquela altura, paquete

significava para mim

um navio enorme,

e eu, de navios, só sabia

como a hialina manhã os pode recortar

nas docas, a montante,

e como numa anfíbia vergastada gostava

de os sentir à mão.



Mas não.



Naquele dicionário

a palavra paquete e os seus efeitos

careciam de objectivação,

era só andar de um lado para o outro

a entregar papéis,

e pouco mais.



Por isso, só às vezes

estava em paz comigo,

a presumir

que talvez houvesse uma relação subtil

entre o que eu fazia



e o mar alto.




(in Açougue, Corunha, Espiral Maior, 2009)




Foto: © de Amadeu Baptista

1 comentário:

  1. Quanta história para contar, enquanto isso vou lendo e aprendendo. Um abraço, Yayá.

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