Nuno Dempster, Poeta Convidado
Três poemas:
MODO
É claro que o seu corpo nu seria
lindo, se já o é sob o vestido.
No entanto, há qualquer coisa que não tem
para que o ache completo.
A cama, o fim da cama é que lhe falta,
e também a manhã seguinte,
e os dias a seguir, e os anos.
No entanto, há qualquer coisa que não tem
para que o ache completo.
A cama, o fim da cama é que lhe falta,
e também a manhã seguinte,
e os dias a seguir, e os anos.
SE
Se ao menos a poesia fosse feita
de imagens tácteis,
se os meus olhos pudessem afagar
com a ponta dos dedos o teu rosto
na copa do pinheiro manso
e se a colina fosse o corpo,
o ventre que se alteia com a mão
em concha, a púbis,
se o rosto mergulhasse de calor
na fonte ao nomeá-la e, vendo o campo,
o campo se tornasse a cama em que
arrefecias — enfim,
se as palavras pudessem ser os olhos,
e os olhos alongassem os meus dedos,
para que quereria eu a poesia,
se os meus olhos pudessem afagar
com a ponta dos dedos o teu rosto
na copa do pinheiro manso
e se a colina fosse o corpo,
o ventre que se alteia com a mão
em concha, a púbis,
se o rosto mergulhasse de calor
na fonte ao nomeá-la e, vendo o campo,
o campo se tornasse a cama em que
arrefecias — enfim,
se as palavras pudessem ser os olhos,
e os olhos alongassem os meus dedos,
para que quereria eu a poesia,
cansado como estou
de imagens de cinema
em fotogramas cegos com legendas?
LUTO
Eu vi logo que estavas a faltar-me
quando te perguntei se gostarias
de regressar no Inverno
aos temporais da costa,
de rires como rias
por sob o guarda-chuva destroçado.
Falaste de humidade e frio, inventaste miasmas
trazidas pelo mar,
deitaste tudo fora como é hábito
nas mulheres em plena queda.
E então eu, que amava temporais,
esqueci-os, não fosses tu fugir.
De nada me valeu.
quando te perguntei se gostarias
de regressar no Inverno
aos temporais da costa,
de rires como rias
por sob o guarda-chuva destroçado.
Falaste de humidade e frio, inventaste miasmas
trazidas pelo mar,
deitaste tudo fora como é hábito
nas mulheres em plena queda.
E então eu, que amava temporais,
esqueci-os, não fosses tu fugir.
De nada me valeu.
Agora ponho dentro de palavras
a chuva, a ventania, a confusão do mar
numa folha de luto antiga
com tarjas negras que fui buscar a casa dos meus pais.
a chuva, a ventania, a confusão do mar
numa folha de luto antiga
com tarjas negras
Nuno Dempster nasceu em Ponta Delgada, Açores. Publicou os livros de poesia: Dispersão – Poesia Reunida, Edições Sempre-em-Pé, 2008; Londres, &etc, 2010; K3, & etc, 2011. Tem colaboração dispersa em antologias e revistas de poesia. Mantém o blogue À Esquerda da Vírgula.
Periodicamente este blog passará a aprensentar um Poeta Convidado: obviamente, os direitos pertencem aos respectivos autores.
Periodicamente este blog passará a aprensentar um Poeta Convidado: obviamente, os direitos pertencem aos respectivos autores.
Magnífico! Todos envoltos em tons cinza...por algo que se perdeu de nós, por algo que se perdeu em nós... Aplausos!
ResponderEliminarPoemas repletos de emoções. Gostei. Um abraço, Yayá.
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