quarta-feira, 30 de outubro de 2013

Thurídur Gudmundsdóttir


                                            POEMAS DE THURÍDUR GUDMUNDSDÓTTIR


VAMOS

Vamos
antes que o dia se consuma
nas nossas mãos

Vamos
à margem do rio e sintamos
antes que as lágrimas
sequem nas suas margens amarelas

Vamos
olhar as flores e as cerejeiras
brancas
antes que as nossas mãos cegas
acariciem o rugoso dia
e o amor esteja ausente

Vamos

Hlátur thinn skýjadur, 1972



A TUA MORTE NA MINHA VIDA

Afundo os remos suavemente
no entardecer

Não,
no teu sangue
e aproximo-me veloz
da vida

Hlátur thinn skýjadur, 1972



JUNTO AO CAMINHO

Dá-me uma tarde cheia de cor

Telhados vermelhos
ardendo de tristeza
ao sol que morre

Barcas de pescadores
saudando a praia

E distância
que sangre na tua presença

Hlátur thinn skýjadur, 1972


ENVOLVE EM CREPÚSCULO

Envolve em crepúsculo
os arbustos

Criaremos a noite
acenderemos a noite
semearemos histórias
em olhos infantis semi-abertos
E logo me darás o teu hálito ardente
e escutaremos juntos
Veremos abrir-se o céu
e pintaremos na escuridão
os nossos múltiplos desejos

Envolve em crepúsculo os arbustos
criaremos a noite

Hlátur thinn skýjadur, 1972



FLORES DE ORVALHO

Flores de orvalho adornam as janelas
das nossas casas

Quando pões
as tua palmas cálidas
sobre o orvalho
através das tuas mãos
vejo o mundo exterior
envolta na treva
que não queremos ver

Flores de orvalho adornam os nossos corações
e nos páramos ardem os fogos-fátuos
a caminho do povoado.

 A svölunum, 1975



UMA ESPÉCIE DE AMOR

Gostaria de me afogar nos teus olhos

E depois o meu cadáver
chegaria à costa
como fugaz recordação
daquela menina
que te olhou
há mil anos

Menina
de tranças louras
e olhos azuis
não reconhecerias o cadáver

Og thad var vor, 1980



PEDAÇOS


O teu pensamento
quebra-se nas palavras
dos teus lábios

Recolho com cuidado os pedaços
ordeno-os, firo-me,
e crio um novo pensamento
meu.

Og thad var vor, 1980



O TEMPO

Pedimos a este instante
que se detivesse

Atiramos flores
ao rio
grandes e azuis
levou-as a corrente
cada vez mais longe

Vimos a nossa vida
reflectida no rio
alhear-se
como as flores azuis

Tomaste a minha mão
e disseste
o tempo é cruel

Og thad var vor, 1980



LIVRO

A tua experiência
parecia-me um livro
formoso e fortemente encadernado
posto numa prateleira
com todos os adornos valiosos

deixaste-me
uma vez
ler algumas páginas

então
olhei-te
como se fosse
a primeira vez que te via.

Thad sagdi mér haustid, 1985



COLAPSO


Desabas-te
alguma vez
sobre ti mesmo
arrastado pelas ruínas magoado
olhando surpreendido
os destroços
e pensado:
sou eu?

os presentes,
bem, todo o mundo
olham-te exigentes
recompõem-te

Cambaleias
agachaste por um pedaço
logo por outro
logo por outro mais

e planeias a reconstrução.

Ordin vaxa i kringum mig, 1989



NA CRUZ

Na cruz
cravaram os nossos pensamentos
e palavras

a cor da nossa pele

a nossa vida a nossa liberdade

na cruz
cravaram o nosso corpo atormentado

na cruz
tocamo-nos

em Cristo

no sofrimento


Ordin vaxa i kringum mig, 1989


Versão minha - © Amadeu Baptista
 
 
 


Thurídur Gudmundsdóttir, nasceu em 1939. Escreve poemas líricos sobre temas quotidianos, memórias da infância e vivências. Versos simples e expressivos que reflectem a dor, a vida. Publicou sete recolhas de poesia, desde 1969.
 

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