sexta-feira, 25 de outubro de 2013

Tarjei Vesaas


                                                POEMAS DE TARJEI VESAAS


ERA UMA VEZ

Era uma vez uma pequena bétula
a que tinham prometido folhas novas
para meados de maio.
Apenas roçagava a terra
por isso
e porque era tão ligeiro.

E chegou também como lhe tinham prometido
um vento de maio.
Mareou-a um pouco
e adoçou-lhe o tronco
e ficou dolorida em todos os seus rebentos.
Um pássaro chegou a pousar
num ramo nu –
e disse que tinha chegado a hora –

Não se deu conta de nada
naquele dia.
Mas quando chegou a noite
a sua magra nudez e o seu esplendor
tinham-se coberto de um verde tenro.

Mareada e viva.
Libertou-se, lentamente.
Libertou-se completamente das raízes, criou.
Navegou como um velame verde pela colina.
Longe daquele lugar para sempre,
– pensou a bétula.

                Leiken och lynet, 1947



A SUPERFÍCIE ESTÁ CALMA

A superfície está calma
no país do fogo,
não se pode ver nada,
tudo está em equilíbrio.

Mas estão passando coisas
a esta hora,
como avalanches flamíferas
em montanhas interiores.
Eles sabem-no, esses poucos
que viram através das fissuras
e sentiram o golpe de calor.

Os homens sentem-se atraídos pelos homens
na sua fome de fogo através de milhares de quilómetros
– e de repente nada há incerto,
olho a olho
mutuamente, sobre a verdade, sobre
a profundidade do fogo e o selvagem encontro dos fogos.

                Løynde eldars land, 1953



OS TEUS JOELHOS E OS MEUS


Os teus joelhos e os meus
e o cálido musgo.
E os anos moços.

O teu sedento medo,
como o meu.
E pesado como o meu.
O olho de Deus num sol
em chamas.
A tua própria confusão
dentro da minha:
Adeus.

                Ver ny, vår draum, 1956


O PÁSSARO

O pássaro estava preparado
junto à estrada esperando.

O pássaro era um milagre.
A sua grande asa
era esquecimento.
O ritmo do pulsar do seu coração
era o meu.

Juntos navegamos
para o desconhecido.
Sem perguntas.
Sem penas.

                Lyv ved straumen, 1970



PEQUENO ROEDORES


A madeira da cerca de trigo range
sob a capa de neve.
O monte pesa como o mundo.
Mas há outras coisas
em que pensar:
A pressão da neve está
esmagando lenta
e silenciosamente
o peito de pequenos roedores
na terra que já não se vê.
Todos aqueles que não tiveram tempo de alcançar refúgio
quando desabou a tempestade de neve e os enterrou
quando corriam por ali.

Pequenos roedores
jazem entre as pálidas palhas húmidas
do verão passado,
sem que saibam onde estão
ou o que aconteceu.
Brilhantes olhos negros abertos
comprimidos contra a erva molhada.
Abertos de par em par para a tempestade.
Descansam em paz até à primavera.
Na primavera
algum pássaro os encontrará
bicá-los-á nervosamente,
levantá-los-á com o bico
e atirá-los-á para o lado.

                Lyv ved straumen, 1970



NO UMBRAL

As sombras deslizam cruzando o campo
como amigos frios, serenos
depois de um dia abrasador.

A nossa alma é um silencioso
país de sombras.
E as sombras vêm deslizando
trazendo amistosos enigmas
e um oculto florescer.

Levantamos serenamente o olhar
Estás já aí,
escura flor minha?

                Lyv ved straumen, 1970



VENTO PERIGOSO

O vento sopra e sacode.
Dançam as velhas folhas.
Rangem as velhas portas.
Mas as velhas ideias tornam-se
novas e perigosas
no vento jovem.

                Lyv ved straumen, 1970


Versão minha - © Amadeu Baptista
 
 
 


Tarjei Vesaas (187-1970). Nasceu em Vinge (no norte do país). É de origem camponesa, Estudos na Universidade Popular. PO seu primeiro livro de poesia data de 1946. Vesaas é um dos grandes romancistas noruegueses. Também escreveu teatro.


 

Sem comentários:

Enviar um comentário