sexta-feira, 8 de junho de 2012

Gil T. Sousa


Gil T. Sousa, poeta convidado



último degrau

assim te levaria
pelo último degrau da lua
e no definitivo clarão
do vinho que me queimasse
deixaria ir
quase tudo o que morria


de poemas (2001)







os que se perderam

que rebentem estradas
sob os pés
dos que se perderam
que nos seus olhos gelados
cresçam fogueiras
*
que o silêncio se curve
como um animal sem voz

de falso lugar (2004)







kopenhagen script

-1-

as árvores furiosamente nuas
largam os seus pássaros negros
num outro mês qualquer
e as estradas separam as folhas
rolam as pedras cansadas de sol
para que o sul seja um lugar
onde a água espera
e o destino se esconde
em forma de ilha
que mão amputar
se assim nos pedem o frio?

-2-

são tão largas as horas
que se consegue ver
a solidão dum comboio vermelho
a raspar a noite
como homens à procura de uma porta
definhando gloriosamente
nas suas estações de
desespero

-3-

pelas gárgulas das catedrais
escoam-se noites antigas
que homens pacientemente sábios
recolhem letra a letra
a neve, tão mansa,
guarda-lhes a sombra e os passos
que numa janela alta e distante
um outro homem há-de ler

-4-

às vezes os navios doem
como ópio num pulmão derrotado
ou como quando tu ficas
no impossível meridiano da ausência
e eu te aceno de um silêncio
que é quase a loucura dos pássaros


de água-forte (2007)




 
 

Fotos (ilustração dos poemas): © de Amadeu Baptista

Poemas: © de Gil T. Sousa




Gil T. Sousa (1957) nasceu e reside  em Vila Nova de Gaia e é Licenciado em Comunicação Social pela Escola Superior de Jornalismo do Porto.
Escreveu:  poemas (2001) e falso lugar (2004) e água-forte (2007) edições privadas do autor.
Nos anos 90 participou em leituras públicas de poesia, 4.ªs-feiras do pinguim café no Porto e na Casa Fernando Pessoa em Lisboa, no âmbito dos encontros promovidos pelo canal de poesia de irc
de que foi um dos fundadores.
É autor dos blogues: poesia, falso lugar e exercícios de esquecimento, onde escreve e divulga poesia regularmente desde 2004.

1 comentário:

  1. Crio o meu próprio suspense!
    Enquanto escuto o som onde prevalecem os violinos...
    Quase não respiro para não acordar os pássaros em loucura...
    Lindo! Obrigada Poeta!
    Um abraço

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