POEMAS
GOSTA OSWALD
Alguém, um poeta, morre jovem.
É como quando se vai deste mundo um caçador de tesouros
– levando o mapa secreto na cabeça.
Mas que profícuo pensamento imaginar que quando um dia
o mar deixar este mundo o fundo estará coberto de tesouros!
Telegram, 1957
A SALAMANDRA
Eu não elejo as chamas
Lançam-me sobre elas
Na intensamente amarela sinto-me inquieta
Na recta não sinto nada
A fumegante é como eu mesma
A transparente evito-a
Se pudesse eleger eu
Mítico réptil
Gostaria de viver tranquila a minha desassossegada vida
Em ti
A resplandecente.
En kärleksdikt, 1960
DURMO EM TI
Durmo em ti
Não o podes saber
Próximo do nascimento durmo
e perto do sedutor
Dás voltas na cama
Como uma baleia grávida
Como um plâncton de grandes olhos
Adormeço em ti
Amo-te
Não o saberás nunca
Próximo da morte durmo
e faço estalar as minhas carapaças.
En kärleksdikt, 1960
BALADA 1952
I
O teu sexo é vermelho escuro
E húmido como carne de fruta
E o negro bosque que o cobre
Ondeia quando sopro
Ali no mais profundo há uma maçã de inverno
Viscosa como após a chuva
E sobre o teu rosto deslizam
As sombras das asas de sete pássaros
Uma perna sobre as minhas costas
Um mão nos meus testículos
E a tua boca abre-se como uma amêijoa
E sinto-me seguro
II
E tu dormes
Com os olhos semi-fechados e os reclames luminosos
Pintam diabos nas paredes
É em Paris ou em Roma
Ou Salzburgo ou
O mundo está demasiadamente connosco
Nós estamos junto
Amanhã vamos a
O teu pé sobre a minha boca
O teu alento sobre o meu pé
III
E amanhã acordamos
Um assobio da rua
No ouvido protesta a bigorna
E tu lavas-te atrás da cortina
E quando saímos vencemos
En kärleksdikt, 1960
O LAMENTO DOS AMANTES
O ácer
espera a primavera
Sabe que voltará
e regará as suas raízes.
Mas o fogo do nosso amor
será encoberto com fuligem
com os anos.
Amada.
Contradiz-me.
Corpos
entrelaçando-se mutuamente.
Nós somos um.
Mas sinto uma ameaça.
É o destino dos amantes,
boca contra boca,
pé contra pé,
ser lentamente empurrados para a morte.
Amada.
Contradiz-me.
Fragmento de Variações sobre Yeats, Ända, 1968
A ORELHA DE VAN GOGH
Van Gogh corta a orelha
Envolve-a num pano
Que lentamente se tinge de vermelho
E envia-o
A ti
Que fazes tu com essa prova
De amor, loucura, dor?
Atira-la com repugnância ao fogo da lareira
Ou ao lixo?
Ou esconde-la furtivamente, talvez com algum orgulho,
Num cofre?
Uma vez sussurras-te nela alguma coisa
Que tu esqueceste
Mas ele recordava
Tenho a vaga ideia de
Que essa orelha continua a existir
Atenta
Escutando eternamente
A luz do cruel campo de cereais
E o rumos do sol implacável
Ända, 1968
Se o amor não correspondido
nos olhos dela
fosse cobre
e a felicidade inexistente
fosse mármore ou granito
Então eu sei de um escultor
que a golpes de martelo e cinzel
poderia converter
o amor não correspondido
e a felicidade inexistente
em amor e felicidade
Mas não é assim
Os olhos dela não são cobre nem granito
mas dor
Então, de que serve o trabalho do escultor?
Det möjliga, 1974
Versão minha - © Amadeu Baptista
Lars Forssell. N. a 14 de Janeiro de 1928, em Estocolmo, onde faleceu, a 26 de Julho de 2007. Estudou na Universidade de Upsala, onde se licenciou em Filosofia e Letras. Estreou-se em 1949, sendo uma figura indiscutível da ‘geração dos anos 50’. Além de poeta, foi um dos grandes dramaturgos suecos do século passado. Também se destacou como ensaísta, tradutor, letrista e jornalista. Em 1971 ingressou na Academia Sueca. Recebeu inúmeros prémios, entre os quais se destacam o Carl Emil Englund e o Bellman.
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