Um laço e um lance de escada,
a sombra revelada é talvez o vulto esperado,
a folha do último outono sobre a clarabóia,
essas linhas paralelas ao teu rosto
onde a ausência rasga uma espera inútil,
um zumbido dentro da cabeça como o primeiro prenúncio
da morte.
A ferida alastra,
a rua enche-se desses mercados ruidosos,
laranjas e amoras que queimam a realidade,
um pregão que anuncia a passagem de mais uma hora,
o gesto parado sobre a cabeça do anjo
que ergue a taça sulfurosa, suspende
o brilho sobre os ombros,
incrimina a paixão.
Agora o sangue alastra e a cidade arde
no ardil da tintura, a gaze
asfixia o olhar,
as mãos desprendendo-se para um lugar
de absoluta solidão,
esse silêncio que corre nas veias
como soro e antídoto
de uma outra grandeza mais feroz,
essa que afasta a sombra do corpo sobre a fronte imaculada,
o lençol que precipita a luz nos olhos cegos,
o destino que vai com o sol para as fogueiras da noite.
O corredor bifurca em dois corredores sem saída,
a panóplia de fragmentações agora recomeça e abate-se sobre o coração,
é ainda possível recordar o quarto minguante que vivemos
no primeiro encontro, saber que não são já as mesmas mãos que escreveram
a subtil despedida, apenas a iniquidade, talvez a pouca sorte,
sem dúvida o constrangimento
de tudo ter sido como que irreal neste espaço brutalmente real
e ter sido a lágrima derramada em vão.
in Antecedentes Criminais Antologia Pessoal 1982-2007, V. N. de Famalicão, 2007
Um dos meus livros.
ResponderEliminarClaro que não ando sempre com ele, não quero que pensem que ando obcecado, mas até ando.
Guardo a página 146, último verso, os poemas das páginas 252, 256 e 259.
Era uma das minhas editoras mas fechou.
O livro comprei-o barato na Trama antes de fechar. Estava esquecido para mim.
Que posso dizer, a não ser:
Obrigado, poeta.
Um abraço,
Carlos Teixeira luís.