segunda-feira, 12 de dezembro de 2011

SALA DOS ACTOS


usa a tua nudez acessórios mortais
para quem procura. a fita de veludo,
o cinto de fivela prateada,
a pintura guerreira, o golpe subtil

com que anuncias a ascensão
ao cume do carinho, exactamente
quando sobre o desvario
distendes os flancos e lanças sobre mim

o golpe intrépido
para que o êxtase estoure no meu corpo
esse mar de grata violência

que pressinto chegar em vagas sucessivas
sempre que gritas e, nesse grito,
desatas o meu grito.


(Arte de António Ferra)


trabalha com a língua, guarnece
de asas o vínculo precário
que nos prende à vida. o brilho
nos teus dentes sugere que a mágoa

pode vencer-se à míngua, acalentando-se
a transparência do sonho, a magnitude
da pele, o sobressalto
que perpassa no teu dorso

e responde à lascívia e ao denodo.
abraça nessa luz o alvoroço
de seres o animal que me conduza

à loba negra que em ti habita
e sob esta penumbra desoculta
a mancha branca que a cama oculta.


(Arte de António Ferra)


agora, vibra, vibra como vibro
ao saber a saliva e a alegria
com que é possível morrer nesta paixão
e ressurgir na graça do tumulto.

afunda no meu peito a energia
que vem sob a penumbra realçar
a tua silhueta de serpente.
no ardor da carícia podes tudo.

estou pronto para o infortúnio
e o assassínio, seja a luxúria esta
e o entendimento

do que nos pode poupar o sofrimento.
que a tua solidão seja na minha
o lume decisivo, a lura, o luto.


(Arte de António Ferra)

( in Umbigo, nº. 20, Lisboa, Março, 2007)

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