POEMAS DE ELSA GRAVE
Proteger-me
sob a tua couraça,
frio que reluzes na neve
e endureces sobre a água,
assim como o lago gelado
abraças folhas de nenúfar
e peixes,
abraça-me tu também a mim,
deixa-me descansar em ti
como num estojo transparente,
rígida e dormente
mas não me abandones nunca
por uns pujantes raios primaveris,
frio,
protege-me
para sempre
sob a tua dura couraça
Som en flygande
skalbagge, 1945
EMBRIAGUÊZ DE CISNES
O mar encrespou-se
e dois cisnes brancos
saíram a nadar para o acalmar
largos instantes permaneceram à sorte
e silenciosos na sua brancura
levaram a sua calma
sobre a crista das ondas
como frescas carícias.
Cresceu a escuridão sobre eles
e as nuvens turbilhonaram
e desceram
como um celeste rodovalho
até aos cisnes
e sugaram-nos
vorazmente
até que resplandeceram
acima das nuvens
como uma lua gémea
no seu fechado pátio
embriagada pela brancura dos cisnes
Isdityramb, 1960
ENQUANTO CHEGAVA A ESCURIDÃO
Enquanto chegava a escuridão
estava a lua esperando
a lua estava silenciosamente
armada
a lua esperava sem respirar
e eu perguntei
se à lua lhe agradava brilhar
ou se era por necessidade
perguntei
e a escuridão chegou
quando me voltei
um resplendor ensombreceu
o bordo da escuridão
e atrás de mim
parou a lua
parou a escutar.
Eu estou ligeiramente armada
esperando sem respirar
e a lua parou
e na escuridão diante de mim
perguntou-me alguém
se gostava de viver
ou o fazia por necessidade
Logo caiu o silêncio
Höstfärd, 1961
Duro é o homem
que aguenta a sua própria vida
e a sua própria morte
que nunca chega ao
limite
do insuportável
O repugnante
nunca basta ao seu asco
a morte não basta
para que se deixa matar
grande é o homem
e cruel na sua força
para suportar a sua própria vida
Hungersöndag, 1967
Não procures o tormento
numa imitação do sofrimento
alivia o tormento a dor
o sofrimento
afasta-te da compaixão lacerante
que parasita
a costa do sofrimento de outros
agora e desde há 2000 anos –
Procura remédio
alívio
não saias
a buscar o sofrimento
para sofrer e suportar
um sofrimento
em honra de alguém
não há qualquer dor
que mereça loa e honra
apenas aniquilação
é o que merecem o tormento e o sofrimento
todos
os que estimulam
ao sofrimento físico
contribuem para
a auto-destruição
a ânsia de dor
que esquece
o mundo exterior
encapsulado nas suas ameaçadoras
trevas
A ânsia de morte
é uma das vozes
a mais importante
e mais estridente na fuga para a auto-destruição
que o homem vocifera
em auto-aniquiladora embriaguez
Slutförbannelser, 1977
ANTI-ESPELHISMO
A vingança do mundo
e a morte das moléculas
fundem-se
nesta poderosa radiação
que se conseguiu construir
para que os homens
aniquilem os homens
e às suas respectivas nações
ninguém sabia a pesar da omnisciência
o que apareceria
nova vida
vida
nova negativa
que com a velocidade das trevas
que é dupla
que com a velocidade da luz
se propagaria
pelo espaço
deslocando leis invisíveis
e ritmos inexplorados
Mas a inalterável lei
que a inescrutabilidade do sentimento
compreende
essa não pode perturbar
o homem:
Que cada vez
que matava o mal
matava também
o que mais amava.
Slutförbannelser, 1977
Versão minha - © Amadeu Baptista
Elsa Grave (1918-2003). Nasceu em
Norra Vran (Escãnia), no sul da Suécia. Estudou arte e foi pintora. O seu
primeiro livro de poesia data de 1943. Além de poesia, escreveu teatro e
romance. É considerada como membro destacado da ‘geração dos anos quarenta’.
Pela sua obra poética recebeu, entre muitos outros, os prémios Carl Emil
Englund e o Bellman.
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