sexta-feira, 28 de setembro de 2012

O Bosque Cintilante # 63

Edvard Grieg: Morgenstimmung

A transparência fixa-se às frágeis colunas da alvorada
e toca o teu rosto com reflexos azuis, a boca
é um doce desfiladeiro rodeado de montanhas, aí me perderei
fascinado pelo vento, avisto-te
nesse vale de flores incandescentes e regresso à memória, um infinito
colar de conjunções onde o teu nome está presente e as tuas mãos
são como a copa de uma palmeira branca que resiste ao deserto
e eu sei receberá a água no pequeno tanque digital por onde
as gotas refrescantes da vida
transitam para um sem-número de prodígios, um sorriso
que é já uma luz que se levanta e caminha sobre a superfície tumultuosa do silêncio.

Ah, essa sombra canta na oração dos teus dedos, um tempo e outro tempo
em que a primavera sucede à primavera e o inebriamento
irrompe dos pequenos clarões de uma gruta orvalhada por subtis cadências
de onde progridem correntes de fumo escarlate, a música
que vem sobrevoar a cabeça das crianças
e lhes inclina os olhos para o espelho do céu
onde os anjos tocam a harpa e a cítara para outra dimensão, o brilho
em que os segredos se acumulam.

Eis a mais dócil palavra do coração,
aí habitam os duendes e todas as substâncias da harmonia, nesse recanto
uma mulher murmura as sílabas do amor,
fantásticas corças negras que entregam o sinal
de que a suavidade existe, existe também o diamante no mais recôndito lugar
do espírito, um enigma,
outro enigma, o enigma a que foi dado o teu nome  
e invoca o paraíso, a bonança que chega.


in O Bosque Cintilante, Maia, Cosmoroama, 2008
© de Amadeu Baptista

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