DOIS MIL E CINCO
Os sortilégios florescem neste caminho
e tenho o sonho de sempre. Alguma vez
daremos as mãos e o círculo em vez de se fechar
há-de abrir-se ao misterioso encanto. Eu estou
com os homens, bem para lá do triunfo desse poder
sem nome, essa facção dos que temem
porque não é bastante o amor. Confio, numa palavra.
E sei quanto vale o fascínio de um cântico,
quanto vale esse inesperado sentimento
de entregar o sonho contra o ódio secular.
Dou um passo, e outro, e outro ainda.
E a voz do vento é audível para além do silêncio,
este mar de gente onde a ânsia aguarda
que a justiça chegue e possa festejar
a amplitude do sangue que há em cada homem.
Eu sei que nos encontramos para não nos perdermos.
Do início de tudo alastra para sempre
um enigma maior que a raça de que somos, um instantâneo
de luz onde um ponto de harmonia
amplia a dimensão do sofrimento
para que haja um sentido universal
que obstine o sonho e proclame a vida.
Apontam-nos a carabina e disparam sobre nós.
Mas há um rastro na frágil transparência
das nossas mãos erguidas sobre a terra,
um golpe subtil que o coração entende
quando as lágrimas fecundam o chão onde fundamos
o sangue de que a terra há-de crescer.
Os sortilégios florescem neste caminho
e tenho o sonho de sempre.
Só o amor transfigurará o mundo.
( in Açougue, Corunha, Espiral Maior, 2009)
Foto: © de Amadeu Baptista
J.S. Bach, Air
Encanta-me este sentimento telúrico...
ResponderEliminarum beijo
Uma reflexão poética linda. Abraços
ResponderEliminar«só o amor tranfigurará o mundo» - tão certa esta sua afirmação, só o amor, o humano que em nós floresce como os geranios, as plantas, a paixão pelo belo, natural e afectivo.
ResponderEliminarbelo poema, Amadeu. um abraço.