quarta-feira, 12 de junho de 2013

Björn Håkansson



POEMAS DE BJÖRN HÅKANSSON



O FUTURO

Alguém, uma pessoa que conhecia,
estava preocupado com o futuro.
Dizia-me que costumava ter terríveis pesadelos
Com que sonhas? perguntei-lhe
Sonho que tudo continua como antes
e que o que se transforma
se transforma de modo como tina podido prever
Não seria culpa tua nesse caso, respondi-lhe
Também essa resposta fazia parte do sonho, disse
Agora não há saída alguma
onde possa despertar

Rymd for ingenting, 1962



JESUS

Descuidadamente pregado estou
trato de me desentender da minha responsabilidade pelo futuro
Em verdade não fui suficientemente claro
Os zelotes acusavam-me de timorato
e os saduceus de loucura revolucionária
enquanto os romanos me tomavam por um zelote
que queria derrubar os estado
Eu aceito o estado, por agora,
à espera de se faça algo supérfluo
Aceito o sofrimento, por agora,
enquanto as armas apenas sejam cravos
Mas espero ter sido claro ao menos num ponto:
o poder de César não vem de Deus
e nós não somos maus.
É César quem nos consome, não nós,
são os seus caprichos que satisfazemos
incluso quando cremos actuar livremente
Com frequência confundimos mutuamente com ele
interrompemo-nos a meio de uma conversa e dizemos
friamente: a minha cabeça mantenho-a eu, muito obrigado–
não confundamos amabilidade com abnegação
Então escuta-se o obsessivo pulsar do seu coração
Tenhai cuidado, para que não fiqueis surdos por isso
Tenhai cuidado, para que não cuideis que é o vosso
Mas ninguém escuta; o tilintar das moedas enche
os ouvidos, a mais a mim que me dão por morto
Tenho de me convencer a mim mesmo para deixar de perguntar:
É acaso pecado a falta de clareza? Ou ainda mais
esclarecimentos fizeram de mim um maldito incompreendido?
O muro é branco como um muro com veias incrustadas
Discípulos e proclamadores, olhai para aqui. Tenho sede!
Fazei uma soma da minha situação
dai-me a vida eterna.

Kärlek i Vita Huset, 1967



DESTINATÁRIO: OLOF PALME

Querido companheiro de partido!
O produto nacional aumenta dia a dia
e os prédios de apartamentos surgem da terra.
Não nos queixamos, porque estamos bastante bem,
mas de vez em quando pomo-nos a pensar.
Agora, por exemplo, a Esso anuncia que procura cozinheiros e empregados de quarto
e criadas, mulheres de limpeza, recepcionista,
também massagista para a sauna, a tempo parcial,
e maquinista, com a missão concreta de cuidar
da piscina coberta. Há ginásio, bar
e locais para reuniões e congressos, ao que parece.
(Anexamos o anúncio.)
Congratulamo-nos, obviamente, pelos postos de trabalho
que graças à localização regional desta construção
nos contenta (ainda que a força de trabalho,
sobretudo na cozinha, seja italiana).
Gastos da construção: quatro milhões.
O jornal local fez uma magnífica reportagem.
(Anexamos o artigo).)
Não nos interpretes mal, somos socialistas leais.
Cremos pois
na necessidade de ter prioridades no sector social
e, em geral, das vantagens em fazer economias.
Cremos
nas vantagens da paz laboral e da solidariedade
entre as classes sociais, caso continuem a existir.
Cremos
que a colaboração com algum grande capital nacional
é a condição para uma óptima planificação de recursos
tendo em conta a actual estrutura da nossa sociedade
e a divisão do poder no campo da economia.
Mas perguntamo-nos, talvez pelos demais,
que talvez perguntem: quem decidiu, realmente,
que a Esso possa construir um hotel com semelhante envergadura
para viajantes comerciais e, no verão, para turistas,
enquanto nós, que vai para quatro anos vivemos em 1700 andares
e carecemos de sauna, praia, serviços, lojas, pub,
berçários, farmácia, banco, polidesportivo e locais
tanto para os nossos hobbys como para as nossas reuniões?
Há um quiosque junto à auto-estrada em que as crianças compram
chiclete com cromos coleccionáveis todos os dias
Agora perguntamos – e não o tomes de modo pessoal –
se tu ou o governo têm algo a ver
no plano de prioridades de serviços acima mencionado
ou se tudo continua a estar dirigido como sempre
dos Estados Unidos. Agradecendo-te antecipadamente a resposta
assinamos
                                   Quatro trabalhadores eleitores de Löten



Mellan två val, 1969


COM A MINHA FILHA

Em Novembro as sombras são
delicadas
como esqueletos infantis.
Desenham-se
sobre os vestígios da folhagem
carnosa do verão
Sob as árvores, junto ao muro,
estou com a minha filha
Ela assinala, eu respondo:
mejengra, gorrião, chapim-azul
A sua mão é tão frágil
que me dá vontade de a levar
à boca, de a beijar
e dizer: Não saias de ao pé de mim!
O mundo não é mais do que uma fina película
que apenas deixa que passe
o sol
Fica comigo
Aquece-me, para que a minha sombra
nunca tenha que encolher-se
dentro do frio.

Fronter i Tredje Världskriget, 1975



PARA A MINHA MULHER NO SEU ANIVERSÁRIO

O orvalho gelado deposita uma cintilação
sobre a erva
Os passarinhos esvoaçam com viveza
nos arbustos de bérberis
Uma mosca desesperada procura
uma abertura na janela
É outono
sem que haja dano como antes
Nas nossas conversas mencionamos
exemplos de filamentos
auréolas
e clareiras inesperadas
onde o bosque descansa
A rotina é um perigo
mas ninguém se queixa de que o coração
pulse regularmente
O hábito põe um selo
Se se quebra
a inspiração não terá sítio
onde dançar
O trabalho é o centro da família
Temo-nos um ao outro
mas se faltar o trabalho
não nos bastaremos
um ao outro
E não te queixes de que quase tudo
caia sobre o abismo.
Vento e água levam
os nossos fracassos
e depositam-nos
na boa terra.

Fronter i Tredje Världskriget, 1975



MONSTRO

Em Creta procuramos o labirinto
No labirinto procuramos o Minotauro
No Minotauro procuramo-nos sós
um ao outro
e quando encontramos o que procurávamos
e matamos o que não compreendíamos
começamos a procurar novos monstros
como se fosse uma saída
o perder.

Utanför familieboken, 1992

Versão minha - © Amadeu Baptista


Björn Håkansson, nasceu em Linköping, em 1937. Licenciado em Letras. Além de poesia escreveu romance e foi crítico literário em jornais e revistas. Poeta comprometido dos anos 60.

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