quinta-feira, 14 de fevereiro de 2013

Bengt Emil Johnson



POEMAS DE BENGT EMIL JOHNSON



«BLUES AFTER HOURS»

Estar
no seu juízo perfeito.
Acorrentado.

Aqui um novo idioma
não mudaria nada
salvo o idioma.

Realidade é tudo o que eu
não conheço.
E parte do que
conheço.


                Vinterminne, 1980


«…IN A FIELD OF WHITE…»

Recordo. Estou sentado a escrever a alguém.
Há muita luz no quarto e está calor.
Nisso não há ambiguidade nenhuma.

Só alguns tons que penetram
no espaço que existe entre o sonho e eu,
e muito do que está em movimento – procedente do

que costumo chamar eu, em todo o caso
agora mesmo. Não causa dano. Não pensava
contá-lo a ninguém.

No entanto talvez eu queira deixá-lo dito.
Também as lâmpadas se reflectem. A luz
está também fora na escuridão que não é pesada.

Está lá fora e eu
estou também lá. É como se alguém
tivesse perguntado e se tivesse ido,

sem inquietação, sem nenhum motivo especial.
Estive aqui antes.
Pode ser que volte a estar aqui.

Ordens fest, 1987

CANÇÃO SOBRE UMA IRMÃS DO PASSADO

Algo delas continua a viver aqui,
algo das suas canções, canções que ciciavam

entre elas ainda que apenas cantassem embora
a canção do seu interior as não movesse

a adoptar expressões particularmente doces, excepto em
ocasiões extraordinárias, surgidas de repente.

(Conheço também obviamente outras irmãs
que consistiam quase exclusivamente de sorrisos,

mas os segredos de que estas eram portadoras
não se vão tratar aqui, não precisamente agora.)

A sua austeridade dependia seguramente da sua fé,
que não se preocupavam muito em praticar;

era o que elas eram, e não havia
muito mais o que fazer sobre essa questão.

Tinham costas muito direitas e puxos
severamente entrançados e bem cheios.

Uma vez instaladas em sofás altos e duros, ou sentadas
em tamboretes baixos, por pintar, apareciam-lhe as veias das mãos.

Nelas tantos os movimentos como as palavras eram em geral
muito enérgicos, mas silenciosos

alcançavam a mais alta tensão. Eu costumava escutar
esses silêncios por causa do seu relevo,

impunham um modo de viver
tão manifesto. Não se permitiam pressas

mas ter uma vida humana a seu cargo
submergia-as numa pressa constante, quase plácida.

Em geral, alguém morrera,
ou estava a morrer nas suas conversas,

mas não era aves de mau agouro,
já que manifestavam demasiado interesse

pelo que acontecia. Tinham os olhos
bem abertos, sempre atentas, e se descansavam

era porque se viam obrigadas, porque isso
fazia parte de uma ordem que elas nunca

poderiam questionar, com isso
nem sonhavam. Liam bastante

muito mais os jornais que
a Bíblia, com ela já tinham acabado há tempo.

(Muito ocupado a estar aqui,
quase absolutamente ocupado, não me preocupo

muito a perguntar
o quê ou quem me mandou

aqui, mas provavelmente essas irmãs
tiveram algo que ver com isso.

Na verdade eu só conhecia uma
delas, mas reconhecia  vagamente

algo que todas tinham,
apenas elas, nas suas parcas visitas,

curiosamente quotidianas
que poucas vezes eram motivadas

por alguma festa pública. Tinham
dignidade, muita mais

que os seus irmãos. Da mais nova lembro, além do mais
o baixa que era, quando me falou

da gralha. Uma gralha cinzenta.) Já
casadas, inclusivamente antes, tiveram que ter sido

eleitas para o estado de viuvez. Faziam
varas de vimes para bater forte no gado

mas às vezes também levavam folhas
para casa pelo simples motivo do verdor? Uma parte

das suas amizades próximas devem ter sido
squaws muito maiores no seu silêncio

do que os seus caciques guerreiros. Sabiam bem
que se tinham perdido muitas coisas para sempre

mas registavam-no sem aparente amargura.
Podiam dar de um discreto segundo plano.

Não se ocupavam de superstições
mas estavam atentas aos sinais

e sabiam perfeitamente bem que alguns
não era susceptíveis de interpretação.

Há testemunhos que indicam que alguma,
pelo menos uma delas, tinha visto lobos vivos.

É difícil imaginar estas
irmãs como amantes ou parturientes

mas eram mães de filhos nervosos
e de filhas de riso demasiado forte.

Naturalmente tinham herdado as consideráveis presas maternas,
sem dúvida alguma estavam grávidas de Tempestades.

Em velhos álbuns, no fundo dos caixotes, guardavam recortes
do Dr. Schweitzer acompanhado de uma outrora opulenta fêmea.

Adoravam guardar coisas simples, sobretudo
de lã, e tudo isso que se pode voltar a usar.

Creio que poderiam ter chegado muito longe, e
então poderiam ter descansado permanecendo

imóveis, tenuemente iluminadas, no alto de pedras da altura
de um homem, junto ao caminho, que pode ter sido muito simples,

talvez um modesto trilho que ninguém seguiu
durante anos, mas que se percebe com toda a claridade

tanto sobre o terreno como no mapa.
Não, eu não falo de orgulho.

Uma débil nuvem de farinha de centeio
em torno ao seu expectante desconcerto.

For resten, 1987


QUADRO

Alguém que está no restolho.
Diz algo.

Uma cerca.

Por trás dele a vala que cavou, ainda que
não se veja.

O restolho finda.
Ele diz algo.
Está a dizer algo.
Vai dizer algo,

enquanto exista a imagem,
enquanto se recorde a imagem.

O dito não importa nada.


Lika, 1991


PRELÚDIO

Morrer
deve ser necessitar-se
um pouquinho.

Lika, 1991


Versão minha - © Amadeu Baptista


Bengt Emil Johnson, nasceu em Saxdalen, na Suécia central. Estudou piano e composição. Trabalha no departamento musical da Rádio Suécia. Nos anos 60, foi um do representantes mais notáveis da poesia concreta. Mais tarde passou a produzir composições texto-som. Trabalhou na fronteira de todos os géneros literários. Nas sua poesia dos anos 80, a natureza e o idioma são as suas preocupações fundamentais. Escreve com uma linguagem quotidiana e auto-biográfica.

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